Uma larga avenida que termina<br> num beco sem saída

Jorge Messias

«A Igreja considera que não se podem abordar os sectores económico, social e político prescindindo da dimensão transcendental do homem. Já a filosofia grega, que impregnou de maneira tão profunda o mundo ocidental, pensava desta forma: o homem só pode descobrir e alcançar a verdade e a Justiça se a sua consciência for iluminada pelo Divino» (Comissão Pontifícia Cor Unum, 4 Outubro 1996).

«Queremos deixar uma palavra de esperança. Análises catastróficas sobre o País e sobre a União Europeia em nada ajudam a serenidade e a generosidade, essenciais para construir o futuro. Não tenham medo dos momentos difíceis pois eles constituem, tantas vezes, alicerces de um futuro melhor. Convocamos todos os católicos para dar realismo à esperança, com o seu compromisso inovador!» (Um olhar de responsabilidade e de esperança sobre a crise financeira do país, Conferência Episcopal Portuguesa, 30.6.2005).

«A economia mundial com centro nos EUA está numa situação onde se combinam a subida dos custos da mercadoria e a desaceleração da produtividade. A inflação global veio para ficar por muito tempo, alimentada e impulsionada pelas corridas especulativas, pelos golpes de mão e operações de curto prazo em busca de super-lucros, pela degradação de tudo o que encontra pelo caminho (recursos naturais, estruturas sociais, etc.). O capitalismo pareceu ter inventado a sua quadratura do círculo. Mas a festa pouco tempo durou. A burguesia que desencadeou a crise confronta-se com uma total incapacidade para transformar o seu domínio num sistema político integrado» (Jorge Benstein, Le Monde Diplomatique, 22.4.01).

Os graves problemas actuais abertos pelo capitalismo começaram muito antes de ser oficialmente reconhecida a crise da chamada «bolha imobiliária», na última década do século XX. Os povos ocidentais viviam, desde os anos 70, a ilusão da falsa prosperidade de um ainda mais falso «milagre económico do capitalismo». Todos tinham poder de compra, acesso ao crédito e direitos sociais. O dinheiro corria a jorros e os trabalhadores europeus eram, na prática, patrões de si próprios; o artificial crédito bancário permitia-lhes comprar casa própria, ter automóveis ou ir a férias no estrangeiro. Como sempre, todavia, havia pobres cada vez mais pobres e ricos cada vez mais ricos. O chamado «Estado Social» funcionava, neste caso, como um tampão do descontentamento popular. O dinheiro lá ia chegando para todos, pela graça de Deus… As estruturas dirigentes do poder capitalista estimulavam estas filosofias.

Foi a partir de 1990 que se começou a compreender que reinava no «país das maravilhas» uma mentira fabulosa. As fábricas fechavam, o desemprego crescia, o crédito era pago «com língua de palmo» pelo contribuinte comum, aumentava a espiral dos preços e a nova moeda única revelava-se, de facto, ser o maior dos embustes. O euro apenas era útil para transferir para as algibeiras dos ricos os recursos dos pobres; para esmagar a soberania dos estados fracos; e para divinizar o dinheiro, tornando-o o único alvo digno de todos os sacrifícios. Para se instalar com base no futuro, a Nova Ordem Mundial exigia o corte das amarras com o passado histórico construído pelos trabalhadores ao longo de dolorosas lutas de classes. É a isto que estamos a presenciar nas terras onde alastra, nos cinco continentes, o polvo neocapitalista.

Para os grandes monopólios, países pobres ou emergentes são aqueles que fornecem aos ricos matéria-prima ou mão-de-obra barata. Países ricos ou desenvolvidos, os que comandam o mundo financeiro, constituem impérios do grande capital ou acumulam os lucros que, por direito próprio, deveriam ser entregues ao Estado Socialista das classes trabalhadoras.

O neoliberalismo global, tal como refere Jorge Benstein, acima citado, ainda que dotado actualmente de uma força esmagadora, «confronta-se com uma total incapacidade para transformar o seu domínio num sistema político integrado». Jamais se viu tanta miséria e tanto dinheiro a correr. Nunca tantos sofreram tanto por tão poucos… Socialismo ou fascismo, é a escolha que continua a impor-se. De momento, o povo que percorria a avenida comprime-se no beco pré-fascista. Por pouco tempo será…

O Vaticano tem voz activa em todos os inapagáveis crimes dos monopolistas. O povo católico mundial bem sabe que assim é! Falta-lhe acordar para a luta social e pela afirmação de princípios positivos que também constam na sua própria doutrina.

 



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